segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Nu, Desci


Essa era apenas uma das muitas brincadeiras que fazia com o próprio nome. Sujeito forte, moreno de olhos verdes - com cristais marrons -, Nudeci ostentava seu bigodão e os cabelos grisalhos; Na verdade já estavam eram brancos, mesmo.
- Desce daí! Sofá não é lugar de ficar pulando. Para de caçar chifre na cabeça de cavalo, rapaz! - pouco repreendia o neto, mas sempre o fazia de forma enérgica e com um tom de voz exclusivo para aquela situação.
Nascido em 1937, no dia 18 de setembro, Nudeci era pai de nove filhos, um deles fora do casamento. Perdera outros dois antes de completarem um ano, ambos fruto do casamento com sua amada Terezinha.
De Governador Valadares, em Minas Gerais, onde nasceu, passou por muitos "causos" até chegar em Cariacica, no Espírito Santo.
Teve a "solitária" que só foi expelida de seu organismo após a ingestão de uma dose da branquinha. Nem remédios tarja preta davam conta do verme.
Já havia saltado de um caminhão em movimento; encabeçou um abaixo-assinado para que as casas da região onde morava - Bandeirantes, em Cariacica - recebessem água encanada.
Mas o mais espantoso era sua habilidade - nunca comprovada - de fazer fogo apenas com as unhas. Sempre ressaltava que o fogo só aparecia ao pronunciar infinitas vezes o mantra "ó bobolhando".
Bobo mesmo o neto ficava quando o avô sabia exatamente quais pedras estavam na mão, e de quem, durante uma partida de dominó. Mas o velho não era muito chegado em perder, não. Chegou mesmo a recolher as peças do dominó ao tomar uma "bicicleta" do neto.
Quantas vezes não esteve em seu ateliê/bar/ponto-de-jogo-do-bicho/ loja-de-artigos-confeccionados-em-madeira, conhecido como "boteco", ouvindo a rádio "Espírito Santo" e fumando seu cigarro?
Não sobrevivera para ver seu neto, que anos antes lhe aplicara a famigerada "bicicleta", trabalhando na rádio que tanto ouvia. Aquele mesmo neto a quem ofereceu uma hóstia na igreja onde era ministro da eucaristia, mesmo sabendo que o jovem não havia feito a primeira comunhão.
Faleceu em 2009, no penúltimo mês daquele ano. Aquele homem tão forte que em um ano havia sido derrotado pelo câncer.
Aquele homem. Meu avô. Meu pai.

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