sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Viva La Merda Rises


“O que você está fazendo?”, perguntou um amigo do cara sentado no sofá de uma república qualquer perto de qualquer universidade dessa merda desse país.

– Bebendo, oras – respondeu o rapaz de semblante cansado, com marcas de um profundo roxo abaixo dos olhos, cabelo despenteado e olhar distante, enquanto tomava mais um gole da cerveja pielsen comprada num bar frequentado por diversos bêbados-de-fim-de-semana que resolveram se arriscar fora do “turno” e bebiam em plena quinta-feira.

– Está bem, vou reformular a minha pergunta. O que você está fazendo com a sua vida? – insistiu o amigo.

– Bem, você quer saber sobre a minha vida, né? Então, para te responder de forma satisfatória, eu vou começar pelo começo...

“A minha existência se resumia a uma minúscula probabilidade de não ser desperdiçado em várias ações que envolviam meu pai e suas paixões. Espera. Isso não importa. Fui além do começo! O começo mesmo pode ser considerado o sagrado momento tão banalizado pelos filmes pornôs que é o ‘jorro da vida’, o ‘espirro do gigante’, ou como queira nomear. Enfim, o momento – que espero que tenha sido bom para as partes envolvidas – em que meu pai e minha mãe faziam sexo casualmente, sem nem pensar na merda que estavam fazendo. É incrível como, antes mesmo de me conhecerem, eles já estavam sendo tão injustos comigo. Daí eu cresci dentro da minha mãe, onde minhas habilidades de parasita foram bastante desenvolvidas, mesmo que inconscientemente. Depois do parto teve todo um trabalho de padronização do uso do meu cérebro, infância dolorosa, adolescência patética até o júbilo existencial do meu primeiro contato com o álcool. E é a partir dessa gama de acontecimentos – resumidos de forma magistral por mim – que temos os componentes básicos para que possamos, enfim, formular uma resposta contundente à sua capciosa pergunta, qual seja, ‘estou bebendo, oras’”, respondeu “de forma satisfatória” o decadente rapaz.

– Ok, Babaca. Mas tem algum motivo para você estar bebendo tanto ultimamente? – retrucou o amigo num tom áspero de quem se arrependeu por ter iniciado um diálogo.

“Pô, então, essa sim é uma resposta complexa de ser dada. Vamos pular toda a construção histórica que foi necessária para que a cerveja se tornasse um elemento tão proeminente na cultura brasileira e vamos ao que importa. Sexta-feira passada eu decidi beber por uma questão de pertencimento a um grupo social, no caso, os universitários. Partindo dessa vontade de ser considerado igual dentro desse círculo social, fui a um barzinho aqui perto com o pessoal da minha turma e bebi bastante. No sábado eu decidi beber porque estava com uma ressaca muito forte e dizem que nada é melhor para curar a ressaca do que uma nova bebedeira. Dessa forma chegamos ao domingo, dia de churrasco de família, isto é, dia de todos os elementos constituintes do grupo ‘família’ variarem numa escala de ‘levemente embriagado’ até o sensacional ‘bêbado como um gambá’ ao qual tenho o orgulho de dizer que fiz parte naquele dia. É uma pena que após um domingo vem uma segunda-feira e precisamos voltar à miserável rotina de trabalho. Por esse motivo tive que beber na segunda-feira no happy hour com o pessoal da repartição. Precisava aceitar o meu triste fado de que a vida não se resume aos fins-de-semana. Na terça eu resolvi beber em homenagem ao grande Tyr, que é quem deu origem ao nome do dia no idioma inglês. Chegamos então ao dia de hoje que é o dia cabalístico no qual resolvi decidir o que vou fazer da vida agora que optei por largar a faculdade. Logo, decidi que vou fazer o que faço de melhor: beber”.

– Certo, então. Vou pra casa da Júlia. Vê se não se mata de beber, hein – alertou o amigo enquanto fechava a porta com a mesma mão em que carregava uma sacola cujo conteúdo seria apreendido por policiais em menos de trinta minutos.

O beberrão espreguiçou-se e pensou: “melhor comprar mais umas cinco garrafas de cerveja antes que a vida acabe. Ih, tem jogo do Flamengo hoje. Melhor comprar vodka”.