sexta-feira, 17 de abril de 2009

Viva la Merda! (1)



"Só em 1980 soube-se da morte do filho de Stálin, Iakov, por um artigo publicado no 'Sunday Times'. Prisioneiro de guerra na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, ele ficou num campo de concentração junto com oficiais ingleses. Tinham latrinas comuns. O filho de Stálin sempre as deixava sujas. Os ingleses não gostavam de ver as latrinas sujas de merda, mesmo que fosse a merda do filho do homem mais poderoso do universo. Chamaram-lhe a atenção. Ficou aborrecido. Repetiram as reclamações e o obrigaram a limpar as latrinas. Ele se zangou, vociferou, brigou. Finalmente pediu uma audiência ao comandante do campo. Queria que ele fosse o árbitro da discussão. Mas o alemão estava muito convencido de sua importância para discutir a respeito de merda. O filho de Stálin não pôde suportar a humilhação. Bradando aos céus atrozes palavrões russos, jogou-se contra a cerca de alta-tensão que cercava o campo. [...]
O filho de Stálin perdeu a vida por merda. Mas morrer por merda não é morrer de mordo absurdo. Os alemães que sacrificaram a vida para ampliar seu império em direção ao leste, os russos que morreram para que o poder de seu país se estendesse em direção ao oeste, esses sim, morreram por uma tolice, e a morte deles é destituída de sentido, de qualquer valor geral. Em contrapartida, a morte do filho de Stálin foi a única morte metafísica em meio a tolice universal que é guerra."

Continua...
Trecho adaptado da obra "A insustentável leveza do ser" de Milan Kundera.

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